Sobre as peculiaridades da Computação Quântica

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O assunto "Computação Quântica" tem ganhado força nos últimos anos. Uma das justificativas é o fato de que grandes empresas de tecnologia como Google, IBM e Intel estão investindo cada vez mais em pesquisas para desenvolver suas máquinas quânticas.

Sobre as peculiaridades da Computação Quântica

Aproveitando essa "onda" de computação quântica, resolvi escrever este artigo discutindo algumas características da computação quântica que a diferencia da computação tradicional.

O conteúdo deste artigo é introdutório, pois o assunto é complexo. Se você quiser se aprofundar, consulte as referências no final do texto.

Índice

O qubit e a sobreposição de estados

Num computador comum, as informações são representadas pelos bits, que podem ter dois valores possíveis: 0 ou 1. A letra C, por exemplo, na tabela ASCII possui o seguinte valor: 01000011.

Já num computador quântico, a representação das informações é feita por meio dos bits quânticos, que são chamados de qubits. Fisicamente, os qubits são estados de um sistema quântico.

Além dos valores (ou estados) 0 e 1, um qubit também pode ser uma sobreposição de 0 e 1. Grosseiramente falando, é como se ele fosse os dois valores ao mesmo tempo.

Representação do qubit através da notação bra-ket

O que eu fiz até agora foi uma síntese do que normalmente é divulgado pela mídia a respeito dos qubits. Entretanto, algumas notícias dão a entender que a sobreposição de 0 e 1 é um "terceiro valor" do qubit. Mas não é bem assim.

Ao executar algum algoritmo num computador quântico, precisamos submeter os qubits a um processo de medição para sabermos o resultado do processamento.

O processo de medição irá forçar os qubits a assumirem aleatoriamente um dos dois valores possíveis, ou seja, 0 ou 1. Portanto, não existe um terceiro valor.

Nas palavras de Sakurai (2011): Quando a medição é realizada, o sistema é 'jogado' em um dos autoestados (...). No nosso caso, os autoestados são os estados 0 e 1 do qubit.

É importante ressaltar que não estou dizendo que não seja possível fazer um computador utilizando um sistema ternário (base 3). Na verdade, até existem pesquisas na área de computação quântica que seguem por esse caminho [3].

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Computadores quânticos são probabilísticos

A medição na Mecânica Quântica produz resultados aleatórios [1]. Ao mensurar um qubit, cada valor (0 ou 1) possui uma probabilidade de ser obtido, que dependerá do hardware do computador quântico.

Dados

Na prática, isso significa que cada vez que rodamos um determinado programa num computador quântico, os resultados de cada execução poderão ser diferentes, ainda que você utilize os mesmos valores de entrada.

Ou seja, todo algoritmo executado num computador quântico é probabilístico: O algoritmo quântico na verdade gera uma distribuição de probabilidade de saídas possíveis (PRESKILL, 2017).

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Cópia de informações

Replicar informações é uma operação bastante comum e importante nos computadores convencionais. Entretanto, encontramos um problema ao tentar fazer isso com informações de um computador quântico.

O teorema da não clonagem estabelece que é impossível copiar fielmente um estado quântico arbitrário [4].

Em outras palavras, você não consegue criar cópias exatas de uma informação quântica. Uma implicação direta é a impossibilidade de criar um backup das informações para protegê-las, por exemplo [1].

Uma alternativa para contornar esse problema é a criação de cópias imperfeitas cujo nível de fidelidade pode ser mensurado, respeitando sempre o teorema da não clonagem, é claro [5].

Ilustração da criação de uma cópia imperfeita de um estado quântico qualquer

Finalizo esta seção enfatizando que através do emaranhamento quântico podemos fazer com que o estado de um qubit A seja igual ao estado de um outro qubit B, caso eles estejam emaranhados. Porém, o estado do qubit B é destruído no processo, ou seja, o estado é copiado, contudo, no final, não temos dois qubits idênticos. Logo, o teorema da não clonagem não é violado. Formalmente, isso é chamado de teletransporte quântico [1].

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Paralelismo quântico

Uma das grandes diferenças entre os bits tradicionais e os qubits é a sobreposição de estados, que foi discutida anteriormente. Essa propriedade do qubit permite o paralelismo quântico.

Suponha que, para abrir uma trava eletrônica, você precisa de uma senha binária de trinta dígitos. Isto é, existem 230=1.073.741.824 senhas possíveis. Num computador tradicional você teria que testar cada combinação uma por uma.

Por outro lado, um computador quântico com trinta qubits poderia fazer isso numa única execução, uma vez que os qubits podem ser uma sobreposição de 0 e 1. Esse é o paralelismo quântico.

Equação do paralelismo quântico
Equação do paralelismo quântico

De fato, é surpreendente, entretanto, para aproveitar o potencial do paralelismo quântico, os algoritmos precisam ser escritos de tal forma que seja possível usufruí-lo. E isso não é algo necessariamente simples.

Outro problema é a correlação existente entre a entrada e a saída dos algoritmos. Como o processo de medição destrói a informação original dos qubits, uma vez que eles são forçados a assumirem um dos estados possíveis, então, se medirmos a entrada, a saída será diretamente afetada. Na prática, a computação ficará restrita ao valor obtido na medição da entrada [1].

Assim, teríamos que executar o programa mais vezes para testar outros valores. Portanto, cairíamos na mesma situação do computador clássico, que calcula cada possibilidade separadamente.

Paralelismo quântico

Novamente, o algoritmo precisa ser projetado para que esse problema não ocorra. Conforme Preskill (2017): Muito da arte de projetar algoritmos quânticos envolve encontrar maneiras de utilizar eficientemente as correlações não locais.

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Quando terei um em casa?

Num primeiro momento, a resposta da pergunta do título desta seção seria "nunca", pois os computadores quânticos que existem atualmente precisam estar num ambiente a uma temperatura muito próxima do zero absoluto (-273,15° C). É o caso dos computadores da D-Wave e da IBM, que utilizam o fenômeno físico da supercondutividade.

Computador quântico D-Wave 2000Q
Computador quântico D-Wave 2000Q (Fonte: D-Wave Systems).

Além disso, algumas das características únicas dos computadores quânticos, como o fato de serem probabilísticos, os tornam inviáveis para o uso no dia-a-dia.

Contudo, quando o assunto é tecnologia, "nunca" é uma resposta perigosa. Por exemplo, em 1945, quem imaginaria que hoje em dia teríamos dispositivos portáteis muito mais poderosos que o ENIAC à nossa disposição?

ENIAC
Computador ENIAC (data aproximada: 1947-1955). Foto de autoria do Exército dos EUA (sob domínio público).

Por enquanto, empresas como IBM [6] e D-Wave [7] possuem computadores quânticos com acesso baseado na nuvem, isto é, você utiliza os computadores remotamente através da internet. É bem provável que essa seja a tendência, principalmente se levarmos em conta que a computação em nuvem ganha espaço no mercado a cada dia.

Laboratório de computação quântica da IBM
Laboratório de computação quântica da IBM (Fonte: YouTube da IBM).

Enfim, o melhor que podemos fazer é observar o que acontecerá nos próximos anos.

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Considerações finais

Ao longo das seções, discutimos várias características da computação quântica, apontando as suas vantagens em relação à computação clássica.

Também apontamos alguns problemas, que são naturais, afinal, estamos apenas no começo. Foi assim com os computadores clássicos e não será diferente com os computadores quânticos.

Na prática, os computadores quânticos serão úteis para solucionar problemas que levariam muito tempo para serem resolvidos num computador tradicional.

A área é promissora e, no futuro, certamente precisaremos de profissionais no mercado para operar essas máquinas, como programadores e cientistas da computação que sejam capazes de criar algoritmos quânticos para resolver os mais variados problemas.

Por fim, este longo artigo é apenas uma pequena introdução à computação quântica. Faltou falar de alguns tópicos importantes, como os circuitos quânticos e o emaranhamento quântico. Talvez fique para um próximo artigo. Para aprender mais, consulte as referências.

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Leia também

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Referências

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