Ragnarök Online: o retorno dos bots

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Ragnarök Online Renegados

Esta postagem vai ser um pouco diferente do habitual. Escrevo-a devido ao infeliz episódio onde o representante de uma empresa de games chamou clientes insatisfeitos com o mau serviço de gado.

O motivo da insatisfação pode ser resumido em três letras: bot, um tipo de programa de computador.

Todas as informações presentes neste artigo contêm atualizações sobre o ocorrido até o dia 8 de dezembro de 2019.

O que é um bot?

Resumidamente, um bot é um software programado para realizar tarefas repetitivas que normalmente seriam feitas por um humano.

Esse tipo de software possui inúmeras aplicações e seu uso tem sido cada vez mais comum com a popularização da internet.

Como todo programa de computador, um bot pode ser utilizado para o bem ou para o mal. O Google, por exemplo, utiliza bots para detectar novas páginas na internet e indexá-las na sua busca.

Por outro lado, bots têm sido utilizados ostensivamente nas redes sociais para impulsionamento de publicações, por exemplo, para fins eleitorais (que é ilegal no Brasil) e para disseminação de notícias falsas, que, entre outras coisas, tentam incentivar pessoas a não tomarem vacina.

Mas o que o Ragnarök tem a ver com bots?

Ainda que o termo bot tenha se popularizado apenas recentemente, graças aos usos que mencionei anteriormente, para quem joga Ragnarök Online o termo é um velho conhecido.

Bot no Ragnarök Online
Exemplo de bot no jogo (círculo verde). É fácil identificá-los devido ao comportamento repetitivo.

Ragnarök é um jogo online de MMORPG. Foi desenvolvido pela coreana Gravity em 2002 e chegou ao Brasil em 2004, sendo distribuído inicialmente pela Level Up e, recentemente, essa responsabilidade foi transferida para a WarpPortal Brasil, um dos braços da Gravity, embora a Level Up seja responsável pela comunidade do jogo.

Desde os primórdios do jogo, bots tem sido utilizados por jogadores para obtenção itens raros e zennys (a moeda do jogo), tarefa que demanda muito tempo. Alguns também utilizam bots para conseguir dinheiro real, vendendo esses itens raros e os zennys. Todavia, o uso de bot em Ragnarök é ilegal e punido com o bloqueio permanente da conta do jogador.

Eu devo ter começado a jogar Ragnarök em 2005 ou 2006, com inúmeros hiatos ao longo dos anos. O problema dos bots existe desde aquela época.

Por quase 15 anos, o jogo era "protegido" por um software chamado Game Guard, que, em tese, deveria impedir que os jogadores utilizassem bots. Contudo, a cada atualização do Game Guard, uma nova atualização era lançada para os bots e o problema persistia. A punição manual era inviável por causa do número de bots simultâneos no jogo.

Arcebispo na cidade de Prontera

Com a queda no número de jogadores ativos ao longo dos anos, o problema piorou e os bots se tornaram uma infestação. Mapas inteiros cheios de personagens robóticos fizeram com que comunidade cobrasse da WarpPortal/Level Up uma atitude.

Foi quando resolveram trocar, em junho de 2019, o software de proteção Game Guard pelo Easy Anti-Cheat (EAC), que é utilizado para proteger contra trapaças jogos famosos como Fortnite e Apex Legends.

A mudança, a princípio, funcionou e os bots sumiram do jogo. Alguns jogadores que haviam desistido do Ragnarök voltaram a jogar depois que o EAC entrou em campo.

No entanto, mais ou menos no final de outubro, os bots voltaram. Isto é, em pouco mais de três meses, o software que controla os bots foi atualizado para burlar o novo sistema de proteção.

Desrespeito ao consumidor

Naturalmente, os jogadores começaram a reclamar. Durante um dos "Kafra News" de novembro, os jogadores perguntaram se o EAC estava funcionando, claramente uma pergunta indireta devido ao retorno dos bots. A resposta de Rufio, um dos porta-vozes da WarpPortal, foi que sim, o EAC estava funcionando.

O Kafra News é um programa ao vivo semanal onde a WarpPortal, por meio de seus porta-vozes, anuncia novidades que serão implementadas no jogo.

O estopim veio no Kafra News da semana seguinte, ocorrido no dia 2 de dezembro de 2019. Na ocasião, antes da transmissão ao vivo começar, os jogadores encheram o chat do YouTube com a pergunta: "O EAC está funcionando?".

Quando a transmissão enfim começou, o Rufio, o mesmo porta-voz que disse que o EAC estava funcionando, disse:

"Eu vi que tem bastante gado no chat porque fica um respondendo o do outro ali..." [3]

Enquanto dizia isso, ele e a outra porta-voz, Belladona, riam da situação.

Sim, pela segunda vez, a WarpPortal ignorou as reclamações de bots no servidor e ofendeu seus clientes insatisfeitos.

A comunidade do jogo obviamente não deixou a situação por isso mesmo. Alguns Youtubers que fazem vídeos de Ragnarök (tal como SkT3, Vimas e Kai Stream) e a comunidade do jogo reagiram.

O vídeo recebeu inúmeros deslikes e comentários demonstrando a insatisfação dos jogadores.

A reação da WarpPortal/Level Up? Desativaram o chat das transmissões no YouTube, desativaram comentários dos vídeos e bloquearam o uso da palavra "gado" no Discord oficial do jogo. No fórum oficial do jogo, qualquer comentário acerca do ocorrido é ignorado pelos administradores.

Como combater os bots ilegais?

A única forma viável de combater os bots é impedindo que estes acessem o jogo e banindo-os de forma permanente. Isso é óbvio.

Anos atrás, havia esforços para banir contas manualmente, porém, considerando que um único computador pode rodar vários bots ao mesmo tempo, isso é impraticável.

A WarpPortal e a Gravity possuem meios para detectar personagens controlados por programas ilegais. Em comunicado sobre o assunto, em 2012, isso ficou implícito quando eles falaram de estatísticas do declínio do número de usuários de programas ilegais:

Nossas estatísticas indicam um declínio no número de usuários de programas ilegais, e estes resultados foram notados por diversos jogadores, que nos informaram melhoras significativas em mapas conhecidos [6].

Todavia, diferente do que ocorre hoje, a própria empresa admitia que o problema era complexo:

É importante reforçar que este é um processo contínuo, de difícil solução definitiva, mas que estamos trabalhando para que este cenário, sem a presença de BOTs, torne-se comum para nossos usuários [6].

De uma forma geral, combater bots não é simples. As redes sociais, mesmo geridas por empresas gigantes de tecnologia, são infestadas de perfis falsos controlados via software.

Acredito que o caso do Ragnarök não possua uma solução definitiva. São 15 anos de jogo no Brasil e os bots sempre estiveram presentes. O máximo que talvez a Gravity consiga fazer é criar soluções paliativas que resolvam o problema no curto prazo e amenizem a situação. Independente de qualquer coisa, é essencial respeitar o cliente.

Ouvir clientes reclamando todos os dias do mesmo problema é chato? Sem dúvidas! Eu trabalhei três anos em Call Center, metade desse período em atendimento ao consumidor. Quando ocorria uma falha geral no sistema, eu tinha que atender dezenas (sim, dezenas) de clientes diariamente reclamando do mesmo problema até que o mesmo fosse resolvido.

Contudo, o lema número um de qualquer empresa é: o cliente sempre tem razão. Por mais que isso muitas vezes signifique uma contradição lógica, já que existem situações em que o cliente de fato está errado, ele sempre vai ter razão.

Conforme o SkT3 reforçou em seu vídeo, é necessário ser franco e não mentir, pois a mentira tem perna curta [4]. O sentimento de ser enganado não gera reações amistosas.

Não quero mais estender este artigo. Apesar de fugir um pouco do assunto do blog, acredito que esse caso da Level Up/WarpPortal é um bom estudo de caso sobre como um profissional ou uma empresa não devem agir. E isso é especialmente importante para quem é da área da computação, que inevitavelmente vai lidar com clientes em algum momento da vida profissional.

Atualização (10/12/2019)

O Rufio, se desculpou por ter chamado os jogadores de gado no fórum oficial do jogo, uma atitude plausível [7].

Pedido de desculpas do Rufio
Screenshot do pedido de desculpas no fórum

No Kafra News do dia 9 de dezembro de 2019, também houve um pedido de desculpas, logo no início do vídeo [8].

Contudo, não tivemos uma resposta sobre a questão dos bots.

Referências

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